Rio - Com 14 distritos e uma extensão territorial quatro vezes maior que a cidade do
Rio de Janeiro, o município de Campos dos Goytacazes, no Norte Fluminense, já foi conhecido como a capital do petróleo e do açúcar. Atualmente, é um reconhecido polo comercial e financeiro, que vai receber nos próximos anos dois grandes projetos: o Porto do Açu e o Porto Farol Barra do Furado. Em mais uma entrevista do ‘Painel O Dia no Estado’, a atual prefeita Rosinha Garotinho, que foi governadora entre os anos de 2003 e 2007, fala sobre o passado, os projetos e diz que os recentes problemas enfrentados com a Justiça não passam de perseguição política.
Diversos projetos de urbanismo e paisagismo mudaram o aspecto urbano de Campos. Mas em relação à infraestrutura, o que tem sido feito?
Gastamos 20% de nossa verba em obras de melhorias na cidade. E fizemos um planejamento para que as mudanças exteriores caminhassem junto com as obras de infraestrutura. Por isso, as pessoas sentem a diferença quando andam ou chegam à cidade. Não prorroguei prazos de obras, pelo contrário, estreitei o relacionamento com várias empresas. Pois não adiantava eu construir calçada nova e asfaltar a rua, se uma obra de saneamento vai quebrar tudo de novo. Trabalhamos em parceria com a companhia de água e esgoto, por exemplo, e fizemos muitas obras nas galerias de água pluvial. Hoje, somos a segunda cidade do estado em qualidade de saneamento básico. Projetos como ‘Bairro Legal’ e ‘Meu Bairro é Show’ também foram essenciais e levaram esgoto, luz, asfalto e calçadas novas para bairros que estavam esquecidos. Isso se reflete no dia a dia da cidade.
Nos próximos anos Campos será casa de grandes projetos que estão em construção, como o Porto do Açu e o Porto Farol Barra do Furado. A cidade está pronta para o crescimento?
Nenhuma cidade está. Nem o Governo Federal estaria. Mas estamos trabalhando para isso. A população ainda vai se assustar com o crescimento que a cidade vai ter. Pois, como você disse, ainda nem saímos da fase da construção. Mesmo assim já temos mais de dez mil novos empregos, e a cidade não para de crescer.
Mas o que está sendo feito?
Tudo que está sendo feito servirá também para quando este crescimento chegar. Além de todas as obras de infraestrutura, realizamos um trabalho de qualificação de mão de obra para o mercado off shore. Mas precisamos de ajuda, principalmente da iniciativa privada e do Governo Federal. Não adianta o município fazer
investimento sozinho. Por mais que eu esteja abrindo estradas e criando conjuntos habitacionais, a estrutura não depende somente dos municípios. O trabalho é em parceria. Eu discordei, por exemplo, do corredor logístico que o (empresário) Eike Batista estava construindo para o Porto de Açu, pois estava cortando a cidade onde ela mais se desenvolvia. Isso agora será revisto. Ainda temos muito pela frente, mas estamos no caminho certo.
Poderia falar um pouco mais sobre esses investimentos? O que está sendo feito em relação ao transporte, por exemplo?
Isso era uma prioridade, pois Campos está crescendo e com isso cresce também os problemas como trânsito e engarrafamentos. Por isso investimos em obras para recuperação de estradas e rodovias, legalizamos o transporte alternativo e estamos criando um plano viário para a cidade. A passagem social também deu a chance de unir a cidade de uma maneira nunca vista. Campos têm uma extensão territorial quatro vezes maior que o Rio de Janeiro. Então, a distância era um problema para parte da população. Para você ter uma ideia, algumas pessoas não iam para o Centro da cidade por causa do preço da passagem. Na nossa divisa com o Espírito Santo, só a passagem de ida custava R$ 12. Hoje a realidade é outra. Já que tivemos um aumento no número de passageiros, exigimos que as empresas de ônibus aumentassem também o investimento para modernização da frota. Quando assumi, a frota tinha mais de 12 anos. Hoje tem seis. Ainda precisa melhorar, mas já temos inclusive ônibus com acessibilidade.
E os investimentos na saúde? Quais foram?
Olha, se eu fosse fazer saúde só com recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) seria o caos. Eu invisto R$ 40 milhões a mais da verba dos royalties do petróleo na saúde. Acabamos com as filas de madrugada para marcação de consultas, que hoje é feita online no próprio posto de saúde. Quase todos os postos oferecem coleta para exames simples, criamos o serviço de ‘Emergência em Casa’ e fomos o primeiro município a disponibilizar vacinas preventivas. Hoje vacinamos gratuitamente as meninas contra o HPV e fomos o primeiro município do estado a oferecer vacina contra hepatite A, que não está no calendário do Ministério da Saúde. Só com a vacina para meningite, outra que oferecemos, reduzimos em 40% a mortalidade de crianças de um ano. Além disso, estamos construindo leitos de CTI, que deve aumentar em 70% a capacidade desse tipo de atendimento no município.
Em janeiro deste ano as chuvas causaram estragos. Há alguns anos a população sofre com enchentes. O que a prefeitura tem feito para resolver esse problema?
Quando eu assumi o governo, mais de 23 mil pessoas estavam desabrigadas pelas chuvas e milhares moravam em áreas de risco. Isso é um problema constante em Campos, mas hoje a realidade é outra. Campos é uma cidade plana, então, quando chove, mais forte o rio sobe e a água chega à cidade pelos bueiros. Por isso fizemos obras de saneamento e hoje já temos quatro estações de tratamento de água e esgoto, três delas inauguradas no meu mandato. Aumentamos as galerias para dar vazão à água das chuvas. Uma dessas galerias até trata o esgoto que é jogado no Rio Paraíba do Sul.
Mas e as pessoas que moram em locais de risco, o que foi feito?
Não existe hoje no Brasil nenhum município que tenha um Programa Habitacional maior que o nosso. Até o final do ano serão 5.100 casas entregues à população. E já estou construindo mais 320, todas recuperadas de obras que foram abandonadas em governos passados. Além disso, já entramos em processo de licitação para mais 4.900 casas. E as casas que eu faço não têm padrão popular.
Como assim?
Todas as casas são entregues com piso, laje, telhas e são coloridas, com textura nas paredes. Faço questão que todas as minhas casas, creches e escolas sejam lindas. Hoje, 10% das casas que entregamos são adaptadas para idosos e cadeirantes. São 12 conjuntos residenciais em pontos distintos do município, totalmente urbanizados. Só nesses conjuntos foram criadas mais de 600 novas ruas, todas entregues com água, esgoto, calçada, luz e asfalto. Tudo com muita qualidade. Esse negócio de achar que para pobre tem que ser obra porcaria comigo não ‘rola’. A creche que eu entrego é a mesma que eu escolheria para meus filhos.
Por falar em creche, o que foi feito para educação em Campos nos últimos anos?
Quando eu assumi o governo, a educação em Campos estava à frente somente do sertão nordestino. Mas o processo de mudança na educação é lento. Antes do meu governo, a grade curricular era uma bagunça e cada escola ensinava o que queria. Hoje isso mudou. Padronizamos a grade curricular, compramos material didático, oferecemos merenda e transporte escolar de qualidade e criamos um Plano de Cargos e Salários para os professores. Além disso, quase 200 escolas do município foram reformadas. Durante meu mandato, serão seis novas escolas, que atenderão cerca de mil crianças e 29 novas creches, oito delas construídas com verba do Governo Federal. Todas as outras creches e escolas foram construídas e reformadas com a verba dos royalties do petróleo.
A senhora foi atuante na briga pelos royalties, chamando inclusive a população para protestar nas ruas contra a possível mudança na distribuição desses repasses. Qual seria o impacto dessa mudança?
Eu não sei de qual mudança estamos falando. Porque, se for do jeito que está sendo proposto, o estado do Rio de Janeiro, em especial seus municípios, irão à falência. Ainda que seja uma mudança para o futuro. Com o fim do repasse dos royalties nosso futuro está seriamente comprometido. O impacto seria desastroso para toda população. Mas nem a discussão é justa, pois a única coisa definida é que estão querendo o nosso dinheiro. Porque que não falar de royalties das águas, do minério e de outros recursos? Estão rasgando a lei e a Constituição. É um absurdo o que querem fazer com a população do Rio de Janeiro.
A senhora sempre disse que quer ter uma administração humana, pautada na justiça social. Alguns chamam isso de populismo. Como lida com as críticas?
Eu encaro com muita naturalidade. Pela nossa Constituição, todos têm o direito de viver com o mínimo de dignidade. Então, governo com essa premissa. Quem tem dinheiro paga para ter plano de saúde, creche e escola particular. Mas e quem não tem? Tenho que fornecer tudo isso. É um direito de todos. O dinheiro público deve valer para todo mundo no quesito infraestrutura, urbanização, segurança e organização da cidade. Mas o restante deve financiar o básico para aqueles que não têm nada. Hoje gastamos menos de 3% do nosso orçamento em ações sociais. O restante é gasto com necessidades básicas, que fazem parte do nosso programa.
Então a senhora discorda da fama de populista?
Não é uma questão de discordar, mas o que faço é um trabalho necessário. Não construo uma casa para quem não precisa ou dou comida para quem está com a despensa cheia. O que eu questiono é o porquê de para mim e para Garotinho (Anthony Garotinho, marido dela e deputado federal) é populismo, e para o Lula e diversas empresas privadas o nome é outro. Ou é populismo para todo mundo ou é ‘projeto de grande alcance social’ para todos.
A lei de benefícios fiscais, criada pela senhora em 2005, beneficiou a cidade de Campos?
Ajudou não só Campos, mas todo o Rio de Janeiro. O papel mais importante foi a lei Rosinha, criada por mim em 2005, mas que infelizmente foi modificada em 2010. A ideia inicial era dar benefícios fiscais para novas empresas e assim atrair novos investidores. Hoje, a lei já não serve para todos. Agora, o governo do estado aprova ou desaprova para quem eles querem. Tem uma fábrica de refrigerantes, por exemplo, que está se instalando em Campos. Ela deu entrada para receber o incentivo dos 2% de ICMS, mas o pedido foi negado pelo estado. A resposta dada é que a fábrica seria uma concorrente e vai disputar com outra marca que também tem fábrica no Rio de Janeiro. O que o estado tem a ver com isso? A concorrência é uma preocupação dos empresários, e não do governo. A ele cabe se preocupar se a empresa está em dia com os impostos, se o CNPJ está correto, essas coisas. Você tem que dar o investimento para o empresário investir na cidade, e não usar a lei de forma ‘politiqueira’. A lei deveria ser para todos.
Mas e Campos, o que tem feito para atrair investidores?
A principal atração ainda é a lei de incentivo fiscal, que reduz o ICMS de 19% para 2%. Mas eu também modifiquei algumas regras do Fundo de Investimento de Campos (Fundecam), que antes dava recursos quase que exclusivamente para grandes empresas. Hoje damos chances para empresas de médio e pequeno porte, além de empreendedores individuais. Saímos de 12º para 6º lugar no ranking do estado em formalização de mão de obra. Temos mais de sete mil empreendedores individuais, pequenas e micro empresas instalados na cidade.
De acordo com o Índice de Ação Fiscal (IFGF) da Firjan, Campos têm uma das melhores gestões fiscais do estado e foi eleita a cidade que melhor aplicou seus recursos públicos em 2010. O que foi feito para chegar nesse resultado?
Prefeitura não é banco para guardar dinheiro. É claro que existe um fundo de reserva, mas dinheiro público deve ser investido em melhorias para a população e foi isso que fizemos. O dinheiro que recebemos está nas ruas, em obras e projetos que possam contribuir para melhorar a qualidade de vida dos cidadãos.
A senhora tem um bom índice de aprovação de seu mandato. A que atribui essa aprovação?
Campos estava abandonada há muito tempo. Hoje a população vê obras e melhorias. Tanto vê que pede e sugere soluções para os problemas. Eu acho isso saudável. A cidade pode se orgulhar em muitos pontos. Temos um Centro de Eventos Populares Osório Peixoto, o Cepop, um local para receber eventos que tem capacidade de um público de 40 mil pessoas e o maior palco da América Latina em estrutura metálica. Temos também a Fundação Municipal de Esportes (FME), que atende mais de cinco mil pessoas em atividades como futebol, vôlei, basquete e natação. Hoje, estamos entre as cinco cidades que mais investem em esporte. Tínhamos um Plano Diretor antigo, que está sendo modificado e criamos um Conselho para estudar o que pode ser feito para melhorar a cidade nos próximos anos. As mudanças estão sendo feitas. E a população vê isso.
Nos últimos dez anos, a senhora teve problemas com Justiça Eleitoral que resultaram em processos de inelegibilidade, entre outras coisas. No final do ano passado teve seu mandato cassado novamente com a acusação de abuso de poder econômico e uso indevido de meio de comunicação. O que a senhora tem a dizer sobre essas acusações?
Qualquer pessoa que ocupa um cargo público corre o risco de responder processos pro resto da vida. Porque qualquer cidadão que entrar com um processo contra um governante, a Justiça irá acatar. Nessa questão do meu afastamento, eu dei uma entrevista na rádio em junho de 2008, quando voltei a morar em Campos. Na ocasião disse que estava voltando porque topei o desafio do partido em me candidatar à prefeita. Agora se isso é motivo para cassar o mandato tinha que cassar também o da presidenta Dilma (Rousseff), que quando ministra do governo Lula ia para os palanques oficiais como a candidata do presidente. Eu nunca usei palanque oficial. Esse mesmo processo diz que é abuso de poder econômico. Isso não existe.
Mas a senhora foi entrevistada pelo seu marido, que também é político.
Eu não estava no governo, meu marido não estava no governo, não existe abuso de poder econômico por conta de uma entrevista de rádio. O processo que meu marido sofreu é em razão de ele ser radialista e ter me entrevistado. Veja bem, nunca vi um jornalista ser processado porque entrevistou um político. Dentro ou fora do prazo eleitoral. Foi isso que ele fez. É um radialista que entrevistou uma candidata. Se essa ‘moda pega’, todos vocês (jornalistas) serão processados. Isso é ridículo. Então sou obrigada a achar que isso é perseguição. Mas ainda que a Justiça ache que eu estou errada, a Dilma recebeu R$ 5 mil de multa por fazer campanha em palanque oficial. Porque então não me multaram? Porque para a Dilma a lei é de um jeito, e para a Rosinha é de outra? A lei é a mesma.
E sobre a aliança Republicana, Democrática e Popular. O que a senhora tem a dizer sobre essa nova aliança entre os ex-rivais políticos Anthony Garotinho (PR) e Cesar Maia (DEM)?
Olha, política é assim mesmo. Quando as questões ficam no campo administrativo, tudo se resolve. E política é aglutinar forças. Só não se pode perder o foco de que tipo de política você quer adotar, o que você quer defender. A sua posição e suas crenças não podem mudar, mas os entendimentos e alianças vão variando de eleição a eleição. É assim mesmo.
Então a senhora será candidata a reeleição?
Posso ser. A lei me garante.